Vocês querem conversa
Então falemos de algo sério
Da miséria dos putos
Que tiravam fotos no cemitério
Que andaram descalços na calçada
Ou sentados num prédio
Que em casa era um tédio
Só paredes e um teto
Sem nunca ninguém por perto
Na rua brincavam a lei do mais esperto
Por vezes a lei do mais forte
Um caminho traçado quase certo
Quando apareceu a droga e tudo resto
E foi destruindo tudo
O que foi construído com respeito
Eu respeito e aceito opiniões
Mas não me julguem
Por tentar que o sonho fosse feito
Por tudo ter feito
Para não ser mais um no nosso meio
Que o nosso meio trás preconceito
Por vezes uma bala no peito
Uma linha mal cheirada
Ou um caldo matreiro
Que te crava na cova
Onde tiramos fotos a uns anos
Nem todos entendem o que falo
Só os que faziam parte dos planos
Eu derramei sangue meu na estrada
E de uns quantos manos
Por zero, pois disso hoje não tenho nada
E já voou a guita desses mambos
Diferentes ramos
E caminhos que hoje não se encontram
A menos que volte a ver cova
E não veja outra saída outra ponta
Volto à ponta do cano cerrado
Que em tempos ajustou contas
Limpou montras
Calçou nikes em pés com meias rotas
Vê quem confrontas
Nem toda a história é conhecida
Eu nunca gostei de pontas soltas
A loucura não vem de agora
Vem desde os cinco anos
Às cavalitas do cota
A txilar pelas bocas todas
Não me falem de droga
Ou códigos da rua brotha
Hoje enquanto vocês se matam
Eu tou com a pequena
A trincar umas pipocas
Ou a dar umas voltas com ela nas costas
De mão dada na minha amada
Vocês não sabem nada
Eu mudei a vida
Que diziam que ia acabar em cana
Se a minha vida dava um filme brotha
Sim a minha vida foi um drama
Se dormi no chão por falta de cama
Se vendi droga por falta de grana
Se tomei banho num chafariz
Porque em casa não havia água
Isso só sabe quem lá estava
Por isso é que eu falo
Que vivi como se viesse da favela
Todos os putos da escola jantavam
Mas eu não comia a espera dela
A barriga só era cheia às duas da manha
Quando acabava o turno dela
A cota fez tudo por nós
Enquanto o cota limpava quartas
Se falo na fumaça
É porque eu vi a fumaça
E se falo na desgraça
É porque eu senti a desgraça
Mas nada é por nada
E hoje eu agradeço
E percebo
Que conhecimento não tem preço
E pelo que vi que hoje nada meto no nariz
Ou uma prata quis
Nos dias em que a vida
A mim nada me diz
Nos dias em que a vida
A mim nada me diz