Prata da casa
Filho do pai
Um olho de sangue e o outro tão seco que dói
Sono perdido no breu da herança
Sonhas perdido na paz da matança
Vã glória
Derrotar, exterminar
(Dinastias)
Vã glória
Derrotar, exterminar
Eu, pobre mortal, equidistante de tudo
Eu, primeira filha da minha mãe que depois me tornei
Eu, velha aluna dessa escola dos suplícios, amazona do meu desejo
Eu, cadela no cio do meu sonho vermelho
Eu reivindico o meu direito de ser uma monstra
Nem homem nem mulher
Nem XXY nem H2O
Reivindico o meu direito de ser uma monstra
E que os outros sejam o normal
O Vaticano normal
O creio-em-Deus-pai-e-virgíssima normal
E os pastores e os rebanhos do normal
Eu terei uma teta da Lua mais obscena na minha cintura
E um pénis ereto das cotovias
E sete sinais
Setenta e sete sinais, não
Setecentos e setenta e sete sinais
Da endiabrada marca da minha criação
Eu sou a monstra
Que te tiraria o sono se pudesses dormir
Eu sou a monstra
Que habita os teus sonhos na orla de te redimir
Eu sou a monstra
Que deixas atada, com arame farpado, num poço, a extinguir
Eu sou a montra
Do que odeias e temes, te dá nojo e faz rir
Do que odeias e temes, te dá nojo e faz rir
Mas eu ardo na noite
Sou Ovídio, ofídio
Perfídia e Platão
Sou Ofélia, Cassandra e Adão
Sou sida, sou vida
Sou Medusa e Atena
Sou Eva daninha sem parra nem pena
Testemunha da tusa
Com que me bates
Então usa, medusa-me
E bate
Bate, bate, bate, bate
Prata da casa
Filho do pai
Um olho de sangue e o outro tão seco que dói
Arranca-me a cara
Medusa-me na farsa
De que a noite é apenas
Descanso pobre
No escuro, no escuro
O amor é o pão que sonegas
No fundo, no fundo
O teu pau é a cruz que carregas