Camisa branca, vela acesa, 7 horas
Faixa, bandeira, o show começa agora
Algum rico ganhou a extrema-unção do padre
Chave pra socialite buscar publicidade
Pede paz quando a bala estraçalha sua boca
Quando a filha aparece morta, no mato sem roupa
O moleque decapitado no esgoto, no lixo
É só uma estatística, um furo jornalístico
Banal pro circo do falso moralismo
Não abala a cadela rica nem o político cínico
Que no domingo tá de iate, rindo à vontade
Enchendo o cu de droga, bebendo Ballantine's
A classe rica só lembra da periferia
Quando quer farinha pra se acabar na danceteria
Cadê a música da paz, o gesto do artista
Quando o jato da Colômbia traz pro morro sua cocaína?
Sua pomba branca tá sangrando no barraco
Em forma de chacina com criança em pedaços
Tira essa vaca do ar, modelo puta falando de nós
Tá querendo Ibope pra posar pra Playboy
Pagodeiro, sertanejo, vem vender CD
A campanha do burguês tem cobertura da TV
Dá pra se promover, até pagar de santo
Fingir que o meu filho morre e o cuzão que rebola tá se importando
Não somos só notícia, número de estatística
Chora playboy, com o sangue da periferia
Não somos só notícia, número de estatística
Cadê a campanha da Paulista, na hora da chacina?
A indignação passageira do boy é moda
Deixa explícita sua atitude preconceituosa
Só merece Globo Repórter, campanha da paz
Quem acende o charuto com nota de cem reais
A puta de megafone no palco, gritando
Não sabe o que é fome, só entende de tamanco
Nunca viu criança estudando no chão
Acha que é cena de filme de ficção
Não é o Stallone metralhando o segurança
É outro excluído querendo vingança
Na mesa de restaurante, na hora do jantar
Duvido que algum cu para pra pensar
No tio doente na caixa de papelão
Querendo sopa quente, um lixo que tem um pão
Na criança de seis anos, catando lata
No alcoólatra com a faca, mandando o filho pra maca
Ao degustar seu caviar, seu vinho italiano
É numa bala no meu crânio que ele tá pensando
Na polícia invadindo, dando botinada
Na pretinha grávida, buscando alguma arma
A censura do meu rap e a Tropa de Choque
Me mostra que protesto é só quando boy morre
Aqui é só flores no caixão e silêncio
Ou bala de borracha e gás lacrimogêneo
Não somos só notícia, numero de estatística
Chora playboy, com o sangue da periferia
Não somos só notícia, numero de estatística
Cadê a campanha da Paulista, na hora da chacina?
Manchete na CNN, vai queimar o turista
Então o presidente chora, rebola na entrevista
Formula seu pacote cheio de medidas
Contra o genocídio, luz na periferia
Na Augusta, meio-dia, a controvérsia
À luz do Sol, olho aberto, um buraco na testa
Apresentador cuzão, falso moralista
Vai lucrar de novo com a desgraça da notícia
Treta no palco, deficiente dá Ibope
Quarenta pontos pra emissora no horário nobre
Quem faz comercial contra a violência
É o mesmo que quer sangue pra ganhar audiência
A minha história não tem maquiagem
Meu ponto de vista não é feito pra vendagem
Eu não agrado gambé, nem arrombado de blindado
Aqui é Facção, representante do barraco
O boy não quer meu bem, só quer minha pistola
Quer me ver com fome, inofensivo, na sua porta
Pedindo esmola, um trocado qualquer
Com ódio, revoltado, mas beijando seu pé
Eu só sou um problema se atravesso o vidro
Pego a bolsa, o toca CD e atiro no ouvido
Quem quer tá no condomínio, vivo e feliz
Não pede paz só quando tem defunto nos Jardins
Não somos só notícia, numero de estatística
Chora playboy, com o sangue da periferia
Não somos só notícia, numero de estatística
Cadê a campanha da Paulista, na hora da chacina?